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Brasil sofre com gargalo tributário


Data: 20 de maio de 2013
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Alguns países se orgulham da sofisticação das suas cadeias produtivas. Não é, com frequência, o caso brasileiro. Aqui, complexa é a cadeia tributária, tão cheia de detalhes e siglas que, em uma representação gráfica, como a desta página, quase oculta a ação do setor produtivo.

 

Em 2012, a carga tributária do país chegou a inéditos 36,27% do PIB, minando a competitividade. Aqui, uma garrafa de vinho paga 45% de impostos. Na concorrente Argentina, apenas 26%.
Além da carga alta, duas questões tornam a tributação um tema momentoso.

 

Uma é que em junho se torna obrigatório incluir a carga tributária na nota fiscal. Para os entusiastas, a população criará uma consciência inédita, passando a cobrar (e votar pela) redução de impostos.

 

A outra questão é que o governo federal tem levantado a bandeira da desoneração tributária. Não é renúncia fiscal pura, mas troca: em alguns setores, deixa-se de arrecadar 20% da folha de pagamento das empresas para cobrar de 1% a 2% do faturamento.

 

As empresas fizeram as contas. Alguns setores, como TI, intensivo em mão de obra, comemoram. Outros viram que seria uma fria. Mesmo as vinícolas, ainda não contempladas, não querem o "benefício".

 

"Não vale a pena. O vinho usa muita mão de obra no campo, mas a folha de pagamento da indústria em si não é grande", diz Kelly Bruch, pesquisadora em direito e agronegócio na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

 

A noção de que as "desonerações" propagandeadas pelo governo nem sempre significam de fato redução da carga tributária traz uma pergunta maior: será possível em algum momento reduzir para valer os impostos no país?

 

A resposta passa pela Constituição de 1988. Ela foi generosa em expressões como "é direito de todos e dever do Estado". Assim, criou aqui, em tese, um sistema de proteção social de país rico europeu.

 

Mas o texto pouco tratou de financiamento. Roberto Campos, provavelmente o mais famoso constituinte crítico a isso, viveu até 2001 reclamando que ninguém se perguntou quem pagaria a conta.

 

Alguns direitos, até pelo exagero, não pegaram. O lazer é um exemplo: difícil imaginar alguém processando o Estado por estar entediado. A moradia também é utopia.

 

Direitos mais objetivos, porém, acarretaram mudanças bem concretas na sociedade --e custos para o governo.

Exemplos são o SUS e a expansão dos benefícios previdenciários. Outro direito social, a educação, foi em alguma medida levado a sério, e nos anos 1990 o país teve sucesso em universalizar a educação básica. Processos contra o Estado por ele não estar provendo tratamentos ou pensões se tornaram comuns.

 

Como nossa renda segue pequena (PIB per capita de US$ 12 mil ao ano, ante US$ 50 mil dos EUA), a conta ficou difícil de pagar. Foi preciso aumentar muito os impostos --e nem assim eles são suficientes para financiar serviços públicos que prestem. No começo dos anos 90, a carga tributária era de 24% do PIB.

 

Houve ainda certa moralização das contas públicas. O Brasil sempre financiou gastos públicos com dívidas ou expandindo sua base monetária --na prática e traduzindo do economês, isso significa imprimir dinheiro.

 

As duas opções nada mais são do que jeitos de jogar o custo para as gerações futuras, que terão respectivamente de pagar a dívida ou lidar com maior inflação (pense que mais dinheiro circulando significa que ele vai ficando menos valioso).

 

Mudanças na gestão econômica (no fim dos anos 80, o Banco Central parou de imprimir dinheiro para bancar empréstimos irresponsáveis do Banco do Brasil; nos anos 1990, foram criadas metas de gasto público, via superavit primário) e na legislação (em 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal) tornaram mais difícil elevar gastos públicos sem aumentar impostos.

 

Resultado: eles aumentaram.

Para reduzir tal mordida, quantificada na relação entre impostos e PIB, é possível:

1) Cortar impostos. Mas vamos desistir do Estado de bem-estar social de 1988?

2) Aumentar o PIB. Mas o números mostram que estamos tendo dificuldade nisso.
Assim, o cenário não é de otimismo. Se não for possível cortar a carga tributária, é razoável fazê-la ao menos deixar de ser o Frankenstein atual.
O Brasil tem mais de 80 tributos. Surgem mais 30 normas por dia. Nas palavras do economista Clóvis Panzarini, "a cada edição do 'Diário Oficial', o sistema tributário brasileiro fica pior".

 

Editoria de Arte/Folhapress

 


Fonte: Folha de S.Paulo

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